terça-feira, 6 de agosto de 2013

A negação da própria força.

     Sabe quando você passa muito tempo, (o suficiente para causar dor por não ter enxergado antes a dimensão da vivência que passou) para conseguir assimilar as ideias de um fato muito impactante?
Pois bem, é assim que agora me encontro. Um ano e seis meses depois do parto do meu filho, em busca de informações para publicar uma nova postagem da Libertinas, recebo a benção de ler no facebook o compartilhamento feito por uma parteira mexicana chamada Naoli Vinaver (da qual acompanho o trabalho desde a gravidez e por ela tenho uma admiração sem fim), de um artigo de revista Trip acerca do parto com prazer.
   Gozei.
   Gozei de sensações indescritíveis por ler relatos e um texto inteirinho sobre isso que ainda é tabu, como tudo o que diz respeito à sexualidade e sim, isso diz respeito à sexualidade. Ai como odeio os tabus.
    Estava iniciando um vídeo do Psicanalista Flávio Gikovate, uma palestra com o tema "Sexualidade sem fronteiras", abordando o livro que estou lendo do mesmo título.
    Entre o vídeo e o facebook encontro o compartilhamento do artigo e, me pus a lê-lo. Cada parágrafo lido foi um nó desfeito nas amarras que me impediam de falar sobre isso livremente pois já não era difícil ouvir um longo "você é louuuuuca" com minhas meras declarações sobre o parto que, de tão bom, por mim seria vivido uma vez a cada ano se financeiramente possível fosse.
     Escrevi um primeiro relato de parto que, afim de atender muito mais aos anseios dos que leriam do que meu próprio anseio de relatar o ocorrido acabou por ter omitido muitos fatos como o de eu ter tido a oportunidade de viver violência obstétrica mesmo após o parto, ao ter que ser transferida da linda Casa de Parto para o pavoroso Hospital do Paranoá onde fui conferida por um Ginecologista Obs-tétrico (mais tétrico do que obstetra) como se fosse um motor de carro num espaço desumano e ainda fui chamada atenção por usar o álcool gel que parecia estar disponível para todos.
      No segundo relato tentei explorar a vivência prazerosa que tive em trabalho de parto ativo quando, ainda em casa, dilatei 6cm em apenas 4h com ajuda de pirão, pimenta, chuveiro quente, auto excitação, livre movimento, paz e tranquilidade. Mas mesmo esse relato não condiz nada com a realidade.
      Após ler o artigo me peguei imaginando o que sentiram nessa hora os meus pais, que estavam em minha casa há um mês aguardando o nascimento do Miguel. Li um trecho no artigo que trata da importância da mulher não ter medo de se entregar ao que virá com o trabalho de parto e lembrei que em momento algum eu senti medo por mim, mas pensei em desistir numa crise depressiva da minha mãe. Ela precisava voltar para a casa dela, pois mesmo com os medicamentos e todos os cuidados ela estava fora do ambiente de segurança dela e a indefinição quanto ao dia do nascimento do Miguel a estava deixando instável. Foi o único momento que pensei em me render à cesária eletiva para que meus pais pudessem conhecer o netinho e voltar para casa satisfeitos. Mas eles aguardaram pacientemente. Muitos problemas nos assolaram até que o trabalho de parto tivesse início e todos foram superados.
       E por isso mesmo imaginei o que os meus pais pensaram quando chegaram no local que eu ESCOLHI para o nascimento do meu filho. Um posto de saúde. Sou a caçula e á única que enveredou por esse caminho de fugir de todo esse ambiente hospitalar para conceber a cria. Não havia sala de espera, apenas bancos defeituoso do lado de fora, no frio. Não havia cafezinho. Não havia médico nem enfermeiros vindo dar notícias. Éramos apenas eu, minha mãe e Eduardo dentro da sala de parto e meu pai do lado de fora, rezando. Enquanto estive em casa o resultado foi 6cm em 4h. Após o deslocamento para a Casa de Parto e a pifada básica do chuveiro quente depois que me instalei na Casa de Parto, levei mais 5h para dilatar o que precisei para parir meu filho. E a coisa ficou feia em alguns momentos, mas eu não era mais racional. Eu lembrava da minha vó indiazinha que devia estar no céu olhando por mim e pariu todos os filhos em casa.  E os urros vinham. Não eram gritos, eram urros. Coisa bem de bicho mesmo.
       Não deixei de sentir prazer em momento algum, gostei de ser bicho. Lembro nitidamente de, apesar do meu total estado de torpor, ter lembrado ao sentir o tal "círculo de fogo' sobre o qual havia lido tanto. Era bom. Depois o cansaço dominou e após o prazer de sentir aquecer como nunca todo o canal vaginal e ouvir de todos: "a cabeça do Miguel é cabeluda, estou vendo!" senti o útero quase que sugando-o de volta e foi quase o fim. Decretei que não conseguiria e ouvi minha mãe dizer "consegue sim, minha filha", enquanto ela empurrava meu pescoço e meu marido puxava minha perna. Todos em sintonia com a contração, quase orquestrados. Nessa hora pedi forças a Deus, minha vó, Nossa Senhora, os anjos e os santos, o Cosmos e o Universo... E urrei! Pelo cansaço mereci ocitocina na veia aos 47 do segundo tempo mas não me incomodei (queria parir meu filho ao natural mas não tive analgesia, senti o processo visceralmente a cada segundo, então a ocitocina foi muito bem vinda), o que me fez ter mais três puxos e na sequência poder sentir, maravilhosamente em cada centímetro percorrido por aquele corpinho, um prazer inenarrável. Foi isso o que senti apesar da foto registrar meu olhar atento e preocupado.
 
          Ainda há muito o que relatar desse parto e para mim a negação da própria força está em esquecermos todos os dias quanto de superação já contamos em nosso Curriculum vitae, que diz respeito à toda nossa vivência e não se atém apenas ao trabalho. Não deveria se ater ao trabalho o que somos, nossas referências.
Essa experiência nunca caberá num relato, numa conversa, numa postagem.
Porém a minha felicidade em ver na propagação dessa ideia a possibilidade de que haja uma real mudança de consciência em busca da vivência plena, de todas as sensações possíveis de se experimentar e saber que elas são infinitas, as possibilidades de experimentação...
           Espero conseguir relatar mais livremente a experiência vivida afim de ser mais abrangente e honesta em relação ao que vivi. Tão logo esse desprendimento ocorra terei imenso prazer em compartilhar nesse espaço onde, finalmente, acredito poder dividir sempre essas experiências profundas com total abertura para as opiniões e comentários.
 
 
*Fontes:
http://revistatpm.uol.com.br/revista/87/reportagens/parir-e-gozar.html
http://www.youtube.com/watch?v=4GnUPa8AN_s

Um comentário:

  1. Linda!!! É muito bom parir, ouvir relatos e ler relatos!!! Obrigado por compartilhar!!
    Bjussss

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